A porta de Paulinho, ou melhor, as portas, ficam no alto. Mas o que aqui não fica no alto? Ele é o criador do Sitiê, um projeto que transformou o lixão em um parque ecológico. Fica num dos pontos mais altos do Vidigal, e pouco a pouco se tornou grande marco aqui dentro da favela.
Visto de baixo, da entrada do Vidigal, a sensação que dá é de impossibilidade de se chegar ao topo, ou se possível, com muito esforço. Essa foi uma das primeiras impressões dentro de muitas quando eu cheguei no Vidigal. Uma experiência em que escolhi e aceitei para mim, e acredito que só conseguimos nos envolver e conhecer um lugar quando de fato vivemos a realidade ou chegamos o mais perto dela.
Tem uma coisa que aprendo todo dia aqui: para se chegar a uma boa vista, é preciso esforço. E altura. Nos primeiros dias morando no Vidigal, via como quase um sacrifício. As subidas e descidas eram difíceis. Não que não sejam agora, mas com o tempo elas se transformam. Pode-se chamar de costume, mas o que se passa por entre cada cantinho aqui dentro, e falo também das pessoas, faz com que as inclinações se tornem apenas caminhos. E o que é a vida se não a soma deles? Aqui, meu mapa é criado a cada passo e as descobertas se extendem a cada cruzamento.
Continuo aprendendo também que a altura não é só referente ao topo, é também sobre crescimento, luta, evolução e resistência. Desde que se pisa aqui, você já começa a subir e seus pés seguem firmes fora do chão rumo a uma realidade tão próxima e distante ao mesmo tempo. Se você se abre, você se dispõe a conhecer a história de um lugar cheio de encantamentos, assim como se abre uma caixinha de jóias. E um dos meus cruzamentos por entre tantos outros, foi com esse homem tão cheio de vida.

Abrindo portas

Paulinho mora aqui no Vidigal e segue pouco a pouco plantando, colhendo, construindo, conectando cada vez mais pessoas com a natureza, e consigo mesmo. Para chegar a sua casa, eu e Juan, meu companheiro de trabalho, sofremos por antecipação assim como na maioria das vezes quando se pensa em chegar àlgum lugar pela primeira vez por aqui: teremos que subir muito, por muito tempo. Mas também como na maioria das vezes, o caminho se encurta. De onde eu moro até sua casa são 15 minutos de subida com rampas, escadas, encontros, desencontros e muito calor. Mesmo com o recurso do google maps, tivemos medo no começo e não deixamos de perguntar sempre que possível a localização para alguns moradores. Receio de se perder que foi desaparecendo juntamente com o aparecimento crescente do cansaço e suor, debaixo dos 40 graus cariocas.
Nos encontramos com ele no parque, um pedacinho verde construído com muita dedicação e amor. Ele, não diferente, nos recebeu de braços abertos. Ao perguntar se ele considerava ali também a sua casa, ele respondeu que

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“nossa casa é onde estamos, pois nunca sabemos se sairemos de lá vivos.”

Seu sonho também é construir um barco para assim poder ir à praia e poder também chamá-la de casa, pois sua morada é onde sua paixão está. Ele então nos convidou para conhecer o lugar onde ele come e dorme. Seguimos. No caminho, abrimos, passamos e fechamos duas portas. Eram como se fossem passagens, limites ou divisões no meio das ruelas estreitas da favela. Confesso que não entendi muito bem a necessidade delas e ainda estou a descobrir. Mas com o passar da tarde, elas começaram a ganhar significado emocional. Elas se assemelham a sua vida, que do mesmo modo foi sendo construída pouco a pouco, com muito cuidado e dedicação, com oportunidades dadas e recebidas a cada encontro, entrada e saída.

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